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Como as mulheres religiosas estão redefinindo o feminismo

Tente equilibrar uns dez pratos por cima da cabeça ao mesmo tempo que tenta impedir que eles quebrem no chão da cozinha. Para as mães da era da pandemia que pulam da pia para o fogão, que dão aulas em casa para seus filhos e que também fazem home office, isso é mais próximo da realidade do que de uma metáfora.

A COVID-19 não tem sido simpática com as mulheres, especialmente para as mães. É claro que temos mais chances de sobreviver ao vírus (dois cromossomos X podem aumentar a resposta de nosso sistema imunológico); mas fazer malabarismo com as reuniões do trabalho pelo zoom e com as compras na feira ou no mercado — enquanto usamos máscaras miudinhas bem apertadas no rosto, que embaçam nossos óculos — tem o poder de mexer com nossos nervos.

Para vocês terem uma noção, por causa desse momento delicado, as mulheres andam três vezes mais suscetíveis a sofrer de problemas de saúde mental.

A pandemia agravou uma situação que já era meio complicada. Como é que as mães conseguem trabalhar em casa ao mesmo tempo que alimentam os filhos ou os ajudam a aprender? Ou como que conseguem trabalhar fora e fazer tantas outras coisas em casa? Por que é que os homens não ajudam mais a cuidar da casa ou tomam conta por mais tempo das crianças?

Quando a juíza Amy Coney Barrett foi nomeada para o Supremo Tribunal dos EUA em setembro de 2020, algumas pessoas concluíram que ela era simplesmente sobre-humana. Nenhuma mera mortal poderia chegar a tal posição na carreira com 7 filhos – SETE FILHOS! – e um marido com um escritório de advocacia que também trabalha bastante.

Mas, além de suas habilidades óbvias, a religião tradicional de Amy — que muitas vezes tem sido criticada por colocar os homens no comando — pode realmente servir como uma vantagem feminista oculta que ajuda as mulheres religiosas a equilibrar a carreira e a vida familiar.

“Cada um de nós mudou e assumiu diferentes responsabilidades, à medida que as coisas iam fazendo sentido. Em algum momento, (meu marido) Jesse começou a cozinhar a maioria das refeições e fazer as compras no mercado”, explicou Amy. Ela disse que ela resistiu no início, mas Jesse venceu. “Acho que isso vai tornar a sua vida menos estressante”, disse-lhe ele. “Vou cuidar disto.”

A experiência de Amy me lembrou de coisas que eu ouvi enquanto eu estava escrevendo um livro sobre universidades religiosas nos Estados Unidos no início dos anos 2000. Passei algum tempo em cerca de vinte faculdades que iam desde a Brigham Young University e Baylor até a Notre Dame e Yeshiva.

Mesmo que tenha acontecido há cerca de 15 anos, fiquei surpresa com o fato de, apesar dos estereótipos das comunidades religiosas e da subserviência feminina, essas jovens tinham aspirações semelhantes às suas colegas em escolas seculares.

O que eu estava descobrindo alinhado com os dados de 2019 da American Freshman Survey, conduzida pelo Instituto de Pesquisa do Ensino Superior na UCLA desde 1973, aproximadamente a mesma porcentagem de estudantes em escolas seculares e religiosas querem ser executivos de negócios, advogados ou “autoridades em sua área”.

Uma das maiores diferenças, no entanto, é entre os estudantes que consideram ter uma família “essencial” ou “muito importante”— 79,5% dos estudantes em faculdades católicas disseram que a família era muito importante ou essencial para eles, em comparação com 66,5% dos estudantes de outras universidades.

Eu descobri por meio de minhas entrevistas que as estudantes que eram religiosas muitas vezes exalavam uma espécie de “pragmatismo calmo” em relação ao seu futuro e famílias. Eu observei na época que seus objetivos pessoais eram mais dirigidos por Deus “do que por seus maridos ou pais.”

Na sequência da nomeação de Amy, o colunista do New York Times, Ross Douthat, perguntou se pode haver um “feminismo conservador que é distinto, coerente e influente?”

Penso que a resposta é sim, na medida em que um compromisso religioso sério parece, de facto, preparar mais adequadamente as mulheres — e os seus maridos — para enfrentar as exigências concorrentes de ser uma mãe que trabalha fora do que a ideologia feminista liberal.

Para começar, a família para estas mulheres não é realmente uma escolha. É um algo que foi adquirido. O que significa que as mulheres religiosas e os seus parceiros começam a pensar e a se planejar para criar uma família muito mais cedo na vida. Isso os coloca em uma vantagem distinta sobre aqueles que estão tentando conciliar os anos mais exigentes em sua carreira, juntamente com encontrar um marido e entrar no período mais trabalhoso de maternidade.

Além disso, as mulheres religiosas são mais propensas a encontrar-se embutidas em comunidades que as expõem às realidades de trabalhar fora e de ter uma vida familiar antes de terem filhos próprios. Essa mesma comunidade também lhes dão uma rede de suporte robusta quando necessitam de ajuda.

Por fim, e talvez mais importante, uma vida espiritual compartilhada muitas vezes fornece a base para o respeito mútuo, para o carinho no casamento e para enfrentar as dificuldades da vida juntos. Como um estudo recente do Instituto Wheatley na Universidade Brigham Young descobriu que casais que frequentam a igreja e participam juntos em rituais religiosos em casa são mais propensos do que outros a relatar tomada de decisões compartilhadas, como por exemplo, a família Barrett.

Ross Douthat sugere que o feminismo conservador realmente não tem um papel em nossa política porque “não foi destilada em uma agenda política — pro-mulher, pro-mãe, pro-equilíbrio trabalho-vida — pelo nosso mundo cada vez mais dominado por homens conservadores.” Mas estas feministas conservadoras (que podem não se descrever como tal) encontraram uma fórmula para o sucesso por conta própria que não exige políticas importadas. E talvez seja a coisa mais feminista de todas.

Imagem de capa e fonte: Deseret News

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